A despeito de todas as declarações de autoridades do mercado dando conta do excelente ano que iniciamos para o setor, tenho que ser cético e realista. 2008 deve ensejar um ano de transformação no mercado que deve incluir conflitos, discussões legais, reversões e consolidações das mudanças ocorridas paulatinamente na última década.
É óbvio que certas projeções efetuadas no final do ano passado substimaram os efeitos da crise do sub prime americano desencadeando uma reação em cadeia mundial. Mas não faltaram alertas à este respeito. É notório que as iniciativas de IPO's no segmento de seguros foram prejudicadas em função dos desdobramentos dessa crise. Mas havia o potencial que isso ocorresse e que foi de forma exageradamente otimista, subestimado. É claro que a abertura do resseguro coloca o país no mundo dos seguros, mas igualmente soltaram fogos antes da realização, que como previsto, deve se efetuar de forma progressiva e geométrica e terá maturação não antes de um período de quatro anos. Ademais temos o nosso próprio sub prime caracterizado por uma política de empréstimos consignados irresponsáveis, destruindo literalmente a estrutura econômica de um sem número de aposentados em sua maioria, com juros mensais perto dos juros anuais cobrados pelas nações mais desenvolvidas, além de uma dívida pública interna elevadíssima, uma dívida externa em crescimento vertiginoso e balanço de pagamentos com viés deficitário. Par e passo, observe-se o retorno do padrão ouro em detrimento do dólar americano, tendo em vista a elevação vertiginosa do metal no mercado. Mas vai explicar isso para políticos? Os investimentos tendem a se manter no país , na medida que fomentarmos com o pagamento asfixiante dos juros da dídida. Investem aqui o que arrecadam aqui, ou alguém tem alguma dúvida disto. Isso tem nome . Reinvestimento de ganhos de capital. O rentismo fez história desde a crise do petróleo de 73, aqui no Brasil. Mas isso é uma tese que poucos podem discutir e que interessa a muito menos.
Antecipar tendências e projetar cenários futuros requer um grande número de informações, e a complexidade operada na globalização de mercados, requer um olhar atento ao que ocorre no mundo real de qualquer segmento, de qualquer economia e a movimentos sutís dos mais variados operadores do mercado e de governos, em sentido amplo.
O que ocorre no Brasil é único, no aspecto regulatório por exemplo, com excesso de interferência do estado, sem sincronismo da equipe econômica e a direção da agência reguladora com macropolítica. Ficou claro que o mercado de seguros não é prioridade da área econômica e de gestão de governo, quebrando as esperanças, que era vidro e se quebrou, de um ano de crescimento acelerado, brecado logo no primeiro dia útil do ano com uma taxação adicional e também indireta ao setor, tendo em vista a crescente participação dos bancos no segmento e a contribuição adicional infligida aos bancos. Certamente com participação elevada nos lucros dos bancos, o segmento de seguros será garfado indiretamente, de forma mais preocupante do que propriamente com o aumento do I.O.F.!
Já no campo institucional, o avanço da consolidação de antigos anseios dos seguradores previstos desde o início dos anos 90, como a abertura do resseguro, bancarização da distribuição do seguro, massificação da distribuição, liberdade tarifária, concentração através de barreiras à entrada de novas seguradoras com o pretexto de normas de solvência, organização da administração dos seguros obrigatórios de forma mais cômoda, criaram seus efeitos perversos junto aos corretores de seguros. Esses efeitos eram previstos mas diante de uma classe dirigente de categoria pouco empenhada pelo comum, de forma acachapante, quase 50% dos integrantes dessa classe foram excluídos do mercado na última década, através das mais variadas ações estruturadas que vão do impedimento ilícito de exercício de atividade regulamentada, passando por concorrência desleal de toda sorte, e por desistímulo operacional, sucateando os processos de B2B ao mesmo passo que ampliavam sua participação direta e indireta com a montagem de agências , sucursais e até corretoras ao arrepio da lei, além do incentivo a criação de corretoras ligadas a revendas de automóveis e lojas de departamentos com expedientes de venda casada, além de estímulos pelo efeito escala, que podem ser caracterizados no mínimo como indecentes.
Esses aspectos vão desembocar neste ano em ações judiciais extremamente onerosas para algumas companhias de seguros. Desencadearão um questionamento legal sobre a construção jurídica da relação entre indústria e distribuição de seguros, com o consequente reflexo na imagem do segmento. Demandarão uma postura mais pró-ativa do órgão regulador nesta área, da qual tem se omitido nos últimos anos, destinando a quase totalidade dos mais de 90 milhões de reais anuais de verba da autarquia para operar como cartório oficializador de alterações contratuais e deliberações de acionistas das seguradoras, assim como de suas políticas setoriais.
Vale lembrar que o órgão regulador foi criado com a intenção do legislador proteger o público consumidor e regular a atividade de concessão do estado.
Neste contexto, aliado a forte disputa por market share entre as companhias dominantes, que causaram um declive acentuado nos preços de seguros de carteiras como automóveis, creio que a elevação de preços seja inexorável, com um consequente ano difícil para o mercado e para consumidores que vão sentir o peso de uma flutuação de preços irresponsável e mal fiscalizada.
Luís Stefano Grigolin, corretor de seguros, consultor e especialista em tecnologia da informação, jornalista e suplente de deputado federal pelo PPS.